segunda-feira, 17 de janeiro de 2011


Dificuldade de Aprendizagem. Orientações para Professores e Pais




Dificuldades de Aprendizagem são aquelas apresentadas ou percebidas no momento em que a criança ingressa no ensino fundamental, onde o conceito irá incluir problemas decorrentes do sistema educacional, de características próprias do indivíduo e de influências do meio em que vive, no qual são vistas como uma condição de vulnerabilidade psicossocial (SANTOS, MARTURANO, 1999).
Dificuldades de aprendizagem são vistas como uma condição de vulnerabilidade psicossocial (Rutter, 1987). A criança com dificuldade na aprendizagem pode desenvolver sentimentos de baixa auto-estima e inferioridade (Erikson, 1971). Dificuldades na aprendizagem escolar freqüentemente são acompanhadas de déficits em habilidades sociais e problemas emocionais ou de comportamento; essas associações se verificam, tanto quando se empregam critérios mais restritivos de identificação das dificuldades de aprendizagem (Kavale & Forness, 1996), como em abordagens genéricas do insucesso escolar (Hinshaw, 1992). Assim, essa condição, quando persistente e associada a fatores de risco presentes no ambiente familiar e social mais amplo, pode afetar negativamente o desenvolvimento do indivíduo e seu ajustamento em etapas subseqüentes (SANTOS, MARTURANO, 1999).
Na adolescência, o fracasso escolar persistente traz o risco de desadaptação psicossocial associado à  evasão. O abandono da escola pode levar ao sub-emprego, a probabilidade aumentada de afiliar-se a grupos marginalizados e a outras circunstâncias que restringem o acesso a oportunidades favoráveis e aumentam a probabilidade de desadaptação (Maughan, Gray & Rutter, 1985) apud (SANTOS, MARTURANO, 1999).
Estudos de seguimento confirmam a condição de vulnerabilidade de adolescentes que apresentaram e/ou apresentam dificuldades de aprendizagem. A maior parte dos estudos disponíveis trata de dificuldades de aprendizagem diagnosticadas. Os adolescentes afetados mostram mais sinais de mau ajustamento pessoal e mais comportamentos anti-sociais (Spreen, 1982), e apenas uma minoria se relaciona satisfatoriamente com seus companheiros (McKinney, 1989). Um estudo de seguimento, realizado em nosso meio, indicou que uma em cada cinco crianças referidas para atendimento psicológico em virtude de baixo rendimento escolar apresentou problemas sérios de adaptação na adolescência, como envolvimento com drogas, incidentes criminais e conflitos intensos nos relacionamentos (Marturano, 1997) apud(SANTOS, MARTURANO, 1999).
A dificuldade de relacionamento é uma variável que aumenta a vulnerabilidade do adolescente com problemas na aprendizagem, dada a importância dos relacionamentos com os pares nessa fase do desenvolvimento. Por outro lado, a família e as relações parentais também afetam a vida dos adolescentes, pois os sentimentos de apego, nesta fase, devem estar seguros para promover a competência social com os pares, ajustamento emocional, auto-estima e menor dependência do suporte externo. A forma como os pais encaram a paternidade e as práticas educativas que utilizam, fazem parte deste processo, que sofre a influencia de diversas variáveis como características dos próprios pais, características dos filhos, contexto social, expectativas de pais e filhos, história prévia dos pais enquanto filhos, entre outras. A interação destes fatores leva a práticas parentais que agem, direta ou indiretamente, nos comportamentos, sentimentos e habilidades dos filhos (Hart, Ladd & Bulerson, 1990)apud (SANTOS, MARTURANO, 1999).
Pesquisas de seguimento realizadas entre a meninice e a adolescência apontam que crianças que apresentaram comportamentos agressivos, mesmo que controlados, naquela fase, continuavam a apresentar tais comportamentos na adolescência, sendo estes comportamentos mais intensos quando comparados com adolescentes que não haviam apresentado tais características na meninice. Parece existir ainda alta correlação entre a estabilidade de comportamentos agressivos, no perí­odo que vai da meninice à  adolescência, por um lado, e por outro, maiores adversidades familiares e práticas educativas autoritárias. Indivíduos que apresentavam maior estabilidade da agressividade entre a meninice e a adolescência pertenciam a famílias que haviam passado por maiores adversidades ambientais e/ou famílias que aplicavam práticas educativas mais autoritárias, não promovendo o autocontrole em seus filhos (Feldman & Weinberger, 1994; Tremblay & Haapasalo, 1994). Adolescentes que vivem em ambientes familiares inadequados, com práticas inefetivas, aparecem como menos populares, menos aceitos pelos pares e com maior probabilidade de dificuldades no ajustamento sócio-emocional e acadêmico (Hart e cols., 1990) apud (SANTOS, MARTURANO, 1999).
Dentre os fatores de ordem interna ao indivíduo, destacam-se os relacionados ao desenvolvimento cognitivo e os de ordem afetivo emocionais, motivacionais e de relacionamento (CARNEIRO, MARTINELLI, SISTO, 2003).
Acresce que, com o passar dos anos de escolaridade dos filhos, os pais passam a monitorá-los menos. O envolvimento adequado dos pais com a escolaridade dos filhos promove não somente o envolvimento dos filhos com esta, como também um melhor rendimento escolar e bom nível de auto-estima (DeBaryshe, Patterson & Capaldi, 1993). A valorização, o engajamento e o encorajamento dos pais com relação à  escolaridade dos filhos promove nos filhos a motivações intrínsecas para o aprendizado, e parecem associados ao maior grau de iniciativa dos filhos em sala de aula. Em contrapartida, pais que não se envolvem, não se engajam com a escolaridade dos filhos ou cobram de maneira excessiva geram um baixo ou alto nível de motivações intrínsecas, sendo que estes adolescentes também têm baixa iniciativa em sala de aula (Ginsburg & Bronstein, 1993) apud (SANTOS, MARTURANO, 1999).
O ambiente familiar sofre influências de diferentes variáveis, advindas de contextos com os quais pais e filhos interagem. A influência destas variáveis sobre os pais parece associada a alterações em suas práticas educativas e, conseqüentemente, ao seu envolvimento com a escolaridade dos filhos. Entre as variáveis que parecem interferir diretamente nas práticas educativas temos: dificuldades econômicas, dificuldades conjugais, psicopatologias parentais, estressores do dia-dia, entre outras. Estas variáveis, que agem como pressões na vida familiar, influenciam de diferentes maneiras em cada fase do desenvolvimento dos filhos (Dodge, 1990; Fauber, Forehand, McThomas & Wierson, 1990; Grych & Fincham, 1990) apud (SANTOS, MARTURANO, 1999).
Diferentes variáveis influenciam no risco de desajuste sócio-emocional e acadêmico dos adolescentes. Parece difícil uma relação direta entre uma dada variável e um problema de desajuste específico. No entanto, tem-se de forma bastante clara que, quanto maior o número de variáveis que agem de forma negativa sobre o ambiente familiar, práticas educativas e filhos, maior a vulnerabilidade dos filhos e probabilidade de apresentarem problemas de ajustamento e desempenho (Fergusson, Horwood & Lawton, 1990; Sameroff, Seifer, Baldwin & Baldwin, 1993). Assim, ao se pensar no ajustamento atual de adolescentes que, quando crianças, apresentaram dificuldades de aprendizagem, temos que considerar as variáveis ligadas à  família e ao adolescente, além das novas características deste período do desenvolvimento (SANTOS, MARTURANO, 1999).
Nas séries iniciais de escolarização, as possibilidades de aprendizagem ou dificuldades por parte dos alunos giram em torno de dois grandes eixos, sob os quais está pautado o conhecimento: o matemático e o lingüístico.  As pessoas que afetam o autoconceito que a criança desenvolve são, geralmente, os adultos importantes em sua vida, como os pais e professores que, na maioria, exercem algum controle sobre a criança e cujas opiniões têm influência sobre ela. Se a criança sofre experiências em que se afirma seu fracasso, provavelmente ela incorporará essa idéia em seu autoconceito, mesmo que não seja condizente com o
real,por outro lado, se suas qualidades positivas forem ressaltadas, tende a ter uma auto-estima elevada. (CARNEIRO, MARTINELLI, SISTO, 2003).
Compêndio de Psiquiatria
Encontra-se no Compêndio de Psiquiatria, os “Transtornos de Aprendizagem”, sendo estes, o Transtorno de Leitura, o Transtorno da Matemática, o Transtorno da Expressão Escrita e o Transtorno de Aprendizagem sem outra especificação (SOE).
O transtorno da leitura se caracteriza por um comprometimento de reconhecer as letras, leitura fraca e inexata e baixa compreensão da leitura na ausência de déficits de inteligência ou de memória significativa. É relativamente comum em crianças de idade escolar. Ao longo dos anos usou–se para descrever deficiências de leitura, rótulos como dislexia, leitura invertida, deficiência de aprendizagem, alexia e cegueira evolutiva para palavras. As crianças com Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) têm alto risco para Transtorno da Leitura. Pode ser uma manifestação de atraso evolutivo ou maturativo. Alguns estudos sugerem uma associação entre desnutrição e função cognitiva. Sua principal característica diagnóstica é um desempenho marcadamente diminuído nas habilidades de leitura. Há ainda outros aspectos característicos que incluem dificuldades na recordação, evocação e seqüência de letras e palavras impressas; no processamento de construções gramaticais sofisticadas e na elaboração de inferências. Além dos testes de inteligência padronizados, devem-se administrar testes de diagnósticos psicopedagógicos, devendo incluir também para avaliação uma observação sistemática de variáveis comportamentais. Crianças com transtorno de leitura cometem muitos erros em sua leitura oral, caracterizando omissões, adições e distorções de palavras. Recomenda-se uma abordagem que empregue sistematicamente os diversos sentidos. As crianças que portam este transtorno devem ser colocadas em uma série tão próxima ao seu nível de funcionamento social quanto possível, e devem receber um trabalho terapêutico na leitura. Problemas emocionais e comportamentais coexistentes devem ser tratados pelos meios psicoterapêuticos adequados. O aconselhamento parental também pode ser útil.
O transtorno da matemática consiste essencialmente de uma deficiência na execução das habilidades aritméticas esperadas para a aptidão intelectual e nível educacional de um individuo. São medidos por testes padronizados administrados individualmente. A ausência da capacidade matemática esperada interfere no rendimento escolar ou atividades da vida diária, e as dificuldades excedem os prejuízos associados com quaisquer déficits neurológicos ou sensoriais existentes. Os dados sugerem que crianças com transtorno de matemática tendem a exibir outro transtorno da aprendizagem ou deficiência da linguagem. A terminologia antiga para o transtorno inclui “síndrome de gerstmann”, “discauculia”, “transtorno aritmético congênito”, acalculia e “transtorno do desenvolvimento da aritmética”. A maioria das crianças com transtorno da matemática pode ser classificada durante a segunda e terceira série do primeiro grau. Transtorno de conduta e transtorno de déficit de atenção/hiperatividade pode estar presentes junto com o transtorno da matemática, e nesses casos, ambos os diagnósticos devem ser feitos. O tratamento atualmente mais eficaz para o transtorna da matemática é a intervenção educacional reparadora. Uma coordenação deficiente pode acompanhar o transtorno, de modo que atividades de fisioterapia e integração sensorial podem ser úteis.
O transtorno da expressão escrita é caracterizado por habilidades de escrita significativamente abaixo do nível esperado para a idade, aptidão intelectual e escolaridade do indivíduo, medida por um teste padronizado. O comprometimento interfere no rendimento escolar e nas exigências de escrita na vida cotidiana, e o transtorno não é devido a um déficit neurológico e sensorial. Os componentes da deficiência da escrita incluem fraca ortografia, erros de gramática e pontuação e má caligrafia. Sua prevalência é desconhecida, mas estima-se que afeta entre 3 a 10% das crianças em idade escolar. As características comportamentais podem exercer algum papel no transtorno da expressão, escrita, especialmente características tais como fraco alcance da atenção e fácil distractibilidade. Seu diagnóstico é feito com base em um desempenho consistentemente fraco do indivíduo na composição de textos escritos. Outros transtornos a serem diferenciados do transtorno da expressão escrita são transtornos da comunicação, transtorno da leitura e comprometimento visual e auditivo. A dislexia se caracteriza por uma incapacidade de ler, e a disgrafia, por uma incapacidade de escrever. A maioria das crianças  com este transtorno fica frustrada e irritada devido aos sentimentos de inadequação e fracasso em seu rendimento escolar. Elas podem, desse modo, desenvolver uma depressão crônica em conseqüência do crescente senso de isolamento, afastamento e desespero. Os adultos que não receberam intervenção reparadora continuam a ter dificuldades na adaptação social envolvendo habilidades de escrita, bem como um contínuo senso de incompetência, inferioridade, isolamento e afastamento, sendo que alguns tentam até mesmo evitar ou adiar a escrita de uma carta ou de um simples cartão de felicitações por medo de sua incompetência ser exposta. O melhor tratamento no momento é a intervenção pedagógica terapêutica. Os professores em algumas escolas especiais dedicam até duas horas por dia a esta instrução da escrita. Problemas emocionais e comportamentais associados e secundários devem receber atenção imediata, com tratamento psiquiátrico adequado e aconselhamento parental.
O transtorno de aprendizagem sem outra especificação (SOE) envolve transtornos da aprendizagem que não satisfazem os critérios para qualquer transtorno da aprendizagem específico, podendo incluir problemas em todas as três áreas (leitura, matemática, expressão escrita) que juntos interferem no rendimento escolar.
Diante do baixo desempenho acadêmico, as escolas estão cada vez mais preocupadas com os alunos que têm dificuldades de aprendizagem, não sabem mais o que fazer com as crianças que não aprendem de acordo com o processo considerado normal e não possuem política de intervenção capaz de contribuir para a superação dos problemas de aprendizagem.  São inúmeras as intervenções que o psicopedagogo pode ajudar os alunos quando precisam, e muitas coisas podem atrapalhar uma criança na escola, sem que o professor perceba, e é o que ocorre com as maiorias das crianças com dificuldades de aprendizagens, e às vezes por motivos tão simples de serem resolvidos. Problemas familiares, com os professores, com os colegas de turma, no conteúdo escolar, e muitos outros que acabam por tornar a escola um lugar aversivo, e o que deveria ser um lugar prazeroso. Dentro da escola, a experiência de intervenção junto ao professor, num processo de parceria, possibilita uma aprendizagem muito importante e enriquecedora, principalmente se os professores forem especialistas em suas disciplinas. Não só a sua intervenção junto ao professor é positiva, também com a participação em reuniões de pais, esclarecendo o desenvolvimento dos seus filhos, em conselhos de classe com a avaliação no processo metodológico, na escola como um todo, acompanhando e sugerindo atividades, buscando estratégias e apoio necessário para cada criança com dificuldade (OLIVEIRA, 2.006).
O aprendizado não é adquirido somente na escola, é construído pela criança em contato com o social, junto com sua família e no mundo que o cerca. A família é o primeiro vínculo com a criança e é responsável por grande parte de sua educação, e de sua aprendizagem, e por meio desta aprendizagem ela é inserida no mundo cultural, simbólico e começa a construir seus saberes. Na realidade atual, o que temos observado é que as famílias estão meio perdidas, não sabendo lidar com situações novas: pais que trabalham o dia todo fora de casa, pais que brigam o tempo todo, desempregados, usando drogas, pais analfabetos, separados e mães solteiras. Essas famílias acabam transferindo para a criança, e esta entra num processo de dificuldade, e acabam depositando toda a responsabilidade para a escola, sendo que, em decorrência disso, presenciamos gerações cada vez mais dependentes, e a escola tendo que desviar de suas devidas funções para poder suprir outras necessidades (OLIVEIRA, 2.006).
A família desempenha um papel importante na condução e evolução do problema acima mencionado, muitas vezes não quer enxergar essa criança com dificuldades que muitas vezes está pedindo socorro, pedindo um abraço, um carinho, para chamar a atenção para o seu pedido, a sua carência. Esse vínculo afetivo é muito importante para o desenvolvimento da criança. Sabemos que uma criança só aprende se tem o desejo de aprender, e para isso é importante que os pais contribuam nesse processo. É cobrado da criança que esta seja bem sucedida. Porém quando este desejo não si realiza, surge à frustração e a raiva que acabam colocando a criança num estado de menos valia, e proporcionando as dificuldades de aprendizagem. Para que o aluno com dificuldades de aprendizagem receba uma educação apropriada as suas necessidades, para além dos profissionais e pais, da adequada formação dos professores e dos agentes educativos, há que ter em conta que o conceito de dificuldade de aprendizagem não implica apenas no reconhecimento do direito que assiste ao educando de freqüentar uma escola regular, pois, caso as práticas educacionais se resumem apenas à sua colocação na escola, sem nenhum tipo de serviços especiais, tais práticas resultam falaciosas e irresponsáveis (OLIVEIRA, 2.006).

Bibliografia

CARNEIRO, Gabriela Raeder da Silva; MARTINELLI, Selma de Cássia & SISTO, Fermino Fernandes. Autoconceito e Dificuldades de Aprendizagem na Escrita. Psicologia: Reflexão e Crítica, 2003, 16(3), pp. 427-434.
KAPLAN, Harold I. & SADOCK, Benjamin J. & GREBB, Jack A. Compêndio de Psiquiatria: Ciências do Comportamento e Psiquiatria Clínica. Tradução Dayse Batista – 7.ed.  – Porto Alegre. Artes Médicas, 1997.
OLIVEIRA, Silvia Suely Sillos de. A importância do psicopedagogo frente às dificuldades de aprendizagem. ABPP. Associação Brasileira de Psicopedagogia. Novembro de 2006.
SANTOS, Luciana Carla dos and  MARTURANO, Edna Maria. Crianças com dificuldade de aprendizagem: um estudo de seguimento. Psicol. Reflex. Crit. [online]. 1999, vol.12, n.2, pp. 377-394. ISSN 0102-7972.  doi: 10.1590/S0102-79721999000200009.


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